
Alunos judicializam critério que levou eleição da diretora de Direito na UFBA. A consulta que elegeu a professora Mônica Aguiar como a primeira mulher a dirigir a Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (FDUFBA) em 134 anos de história virou alvo de contestação judicial.
Um grupo de estudantes tenta anular o resultado da eleição alegando que houve mudança na forma de contagem dos votos durante o processo, o que teria reduzido o peso do voto estudantil e violado princípios de segurança jurídica e igualdade democrática. O pleito não seria quanto a quem foi eleito, mas sim ao critério da paridade que levou a consagração do resultado.
Alunos judicializam critério que levou eleição da diretora de Direito na UFBA
O impasse gira em torno do Artigo 28 do Regulamento da Consulta Informal, que define o peso dos votos dos três segmentos da comunidade acadêmica — docentes, técnicos-administrativos e discentes.
O texto do artigo busca garantir a chamada paridade entre segmentos, ou seja, que cada grupo tenha o mesmo peso (33%) na apuração final, independentemente do número de pessoas que o compõe.
Art. 28: Aos votos de cada segmento serão atribuídos pesos, conforme o previsto na regulamentação interna, a fim de assegurar a participação de todos, sendo a seguinte distribuição: I – Docentes: 0,33; II – Servidores Técnico-Administrativos: 0,33; III – Discentes: 0,33
A dúvida está em como calcular o percentual de votos dentro de cada grupo.
Duas interpretações foram apresentadas:
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Proposta 1 — votos válidos por segmento: considera apenas os votos efetivamente depositados;
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Proposta 2 — total de eleitores aptos por segmento: leva em conta o número total de pessoas que poderiam votar, mesmo as que se abstiveram.
A escolha do denominador altera diretamente o resultado. Como a participação estudantil costuma ser numerosa, mas com índice de abstenção alto, a questão entra em debate.
Mandado de segurança e alegações dos estudantes
Os estudantes entraram com um Mandado de Segurança na Justiça Federal, pedindo a anulação da decisão da Congregação que adotou a Proposta 2.
Segundo os discente, a Congregação teria alterado o critério após o início da campanha, nas reuniões dos dias 3 e 6 de outubro, violando o princípio da segurança jurídica e da igualdade de condições entre os candidatos.
A Congregação alterou as regras no curso do processo, diluindo o peso da categoria discente e tornando seu voto meramente simbólico, afirmam os autores da ação
Ainda é invocado na argumentação o Artigo 16 da Constituição Federal, que consagra o princípio da anterioridade eleitoral — segundo o qual as regras de um pleito não podem ser alteradas durante o seu curso.
Além disso, sustenta que a decisão fere o Artigo 206, inciso VI, da Constituição, que garante a gestão democrática do ensino público. A alteração dos critérios após a homologação das candidaturas quebra a confiança legítima dos participantes e compromete a paridade historicamente praticada na faculdade, afirmam os estudantes no processo.
Defesa respalda eleição em precedentes legais
O Art. 34 das Normas de Consulta Democrática Prévia à Comunidade Universitária para Escolha de Reitor(a) e Vice-Reitor(a) da UFBA (quadriênio 2022–2026), oferece base a Proposta 2. A partir desta conta, Monica atingiu resultado suficiente para ser eleita.
Para a conselheira relatora do parecer administrativo, professora Andréa Presas Rocha, o método adotado pela Congregação é o mais equânime e democrático, com respaldo jurídico e histórico dentro da UFBA.
Se o cálculo for feito apenas com base nos votos válidos, um segmento com baixa participação pode ter seu resultado artificialmente inflado. Já o critério que considera o total de eleitores aptos reflete com mais fidelidade a vontade geral da comunidade, explicou a relatora.
Ela cita ainda o Artigo 121 da Lei nº 11.892/2008 e o Artigo 10 do Decreto nº 6.986/2009, que regulam as eleições paritárias nos Institutos Federais e determinam que o cálculo dos percentuais deve se basear no total de eleitores aptos em cada segmento.
Esse critério não é apenas uma escolha técnica, mas encontra respaldo em legislação específica para processos eleitorais paritários em instituições de ensino. Sua adoção assegura resultados mais justos e representativos, escreveu Andréa no parecer.
O parecer ainda aponta que os estudantes não tem respaldo para falar sobre uma suposta violação à segurança jurídica, sendo que não houve quebra de confiança legítima, já que:
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a eleição não tem caráter vinculante;
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não existia norma interna anterior que assegurasse o método defendido pela Proposta 1;
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a decisão foi tomada por órgão competente, de forma democrática e motivada;
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e a paridade entre os segmentos foi preservada, sendo alterado apenas o método técnico de cálculo.
Em seu posicionamento, a relatora também cita o documento da Comissão da Consulta para Reitoria (2022–2026), que reconhece como correta a fórmula baseada no total de eleitores aptos, e não apenas nos votos válidos. Esse precedente, segundo a argumentação, demonstra que a prática na UFBA já consolidava esse modelo de apuração.
Ainda conforme a defesa, não há provas documentais robustas que confirmem que as consultas anteriores (2017 e 2021) desconsideravam o universo total de votantes no cálculo da ponderação. Atas, deliberações e registros oficiais da época não evidenciam que tal método tenha sido formalmente estabelecido, o que indica que, se aplicado, foi de forma informal e não oficializada.
Liminar Negada
A Justiça Federal negou o pedido liminar dos estudantes para suspender o resultado da eleição, entendendo que eventual irregularidade poderia ser corrigida posteriormente. Com isso, a reunião da Congregação ocorreu de forma natural nesta segunda-feira (20) e oficializou resultado. A reunião foi postada nas redes sociais da nova diretora e da própria Faculdade de Direito.
O direito líquido e certo, se existente, será integralmente protegido ao final, seja pela nova totalização dos votos ou, se necessário, pela anulação e repetição do pleito, afirmou o juiz ao indeferir a liminar.
Um novo pedido de urgência, apresentado ao juiz plantonista no dia 19 de outubro, também foi rejeitado, sob o argumento de que o caso não atendia aos requisitos de urgência. O caso vai seguir o rito processual normal, pelo juízo natural, sem que fosse necessário acionar o regime plantonista.
O Ministério Público Federal (MPF) manifestou “ciência do feito” no dia 20/10/2025, mas indicou que a discussão se dá no “âmbito individual” e não coletivo, e por isso, restituiu os autos para prosseguimento sem pronunciamento de mérito.
Nota do diretor da Faculdade de Direito
Por meio de nota, o professor Júlio Rocha, diretor da Faculdade de Direito reiterou que o processo eleitoral seguiu os trâmites legais acordados:
A Congregação é o órgão máximo de decisão da Faculdade e definiu os critérios que são os mesmos aplicados para a consulta aos cargos de Reitor e Vice-reitor da UFBA. Além disso a sessão ocorrida no dia 20/10 às 17:00 definiu a lista tríplice com apoio dos representantes estudantis e demais membros, servidores e docentes
Eleição
Na consulta, o candidato Celso Castro recebeu 53 votos dos professores, 1.045 votos dos estudantes e 11 votos dos servidores técnico-administrativos, enquanto a professora Mônica Aguiar obteve 55 votos dos professores, 415 votos dos estudantes e 20 votos dos servidores.
Com isso, a Congregação confirmou o resultado e encaminhou ao Reitor Paulo Miguez a lista tríplice com o nome de Mônica Aguiar como diretora eleita.
Em sessão extraordinária realizada em 20 de outubro, a professora destacou o caráter histórico do momento: Farei uma gestão para toda a comunidade, com espaços participativos, acolhimento e escuta qualificada, disse Mônica em rede social.
Quem é prof. Mônica Aguiar
Em sua primeira declaração, Mônica destacou o significado do momento: Este é um novo tempo, um tempo de transformação, de escuta, de compromisso com a verdade e com as pessoas.
Ela também agradeceu o apoio recebido de estudantes, servidores e colegas durante o processo eleitoral. “Nada disso seria possível sem vocês: estudantes, servidores, professores, colegas e amigos que acreditaram em um projeto construído com ética, respeito e amor por esta casa, afirmou.
A professora associada da UFBA, Mônica Aguiar, é formada em Direito pela Universidade Federal da Bahia e também possui graduação em Ciências Econômicas pela Universidade Católica do Salvador. Ela concluiu o mestrado em Direito Econômico na UFBA e o doutorado em Direito das Relações Sociais na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Anteriormente, ocupou o cargo de vice-diretora da FDUFBA, atuando junto ao atual diretor, Júlio César de Sá Rocha.
Na disputa para vice-diretor, Francisco Bertino Bezerra de Carvalho retorna ao cargo que exerceu entre 2017 e 2021. Bertino é mestre e doutor em Direito pelo PPGD da UFBA e já foi coordenador do Colegiado de Graduação.
Com a conclusão do pleito, a Congregação da Faculdade de Direito encaminhou os nomes para a formação da lista tríplice, que será enviada ao Reitor da UFBA, Paulo Miguez, para escolha final.

Sessão de Congregação e violência de gênero
A professora da Universidade Federal da Bahia, Juliana Damasceno, foi alvo de ataques misóginos e xingamentos durante uma reunião extraordinária da Congregação da instituição, realizada no dia 6 de outubro. O encontro discutia a consulta prévia para escolha do novo diretor e vice-diretor da faculdade. Durante a reunião, a professora doutora e vice-coordenadora da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (UFBA), foi chamada de “vadia”.
Segundo a advogada, as ofensas partiram de um dos representantes dos alunos, Pedro Maciel, em meio a um debate sobre uma questão de ordem em processo eleitoral interno. O caso provocou indignação dentro e fora da comunidade universitária.
A gestão do centro alegou que o termo “vadia” não teria sido dirigido a professora Julia Damasceno.
A professora Mônica Aguirre, eleita presidente, prestou solidariedade por meio de nota de desagravo assinada junto com outros colegas da instituição e divulgada nas redes sociais da Faculdade.
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